É inaugurada às 18h desta quarta-feira, dia 7 de Maio, na Fundação Fernando Leite Couto, em Maputo, a exposição “Fora da Caixa”, que reúne obras dos artistas plásticos Albino Mahumana e Renaldo Siquisse. A mostra propõe ao público um diálogo entre linguagens visuais distintas, mas unidas por um mesmo impulso criativo: o de romper limites e reinventar formas de olhar o mundo.
Texto: Amad Canda
Albino Mahumana, que concilia o trabalho artístico com o de fotojornalista, apresenta uma série de obras que partem de dois registos estéticos complementares. De um lado, o quotidiano moçambicano em cenas reconhecíveis — o tchova xita duma, as crianças às costas, as brincadeiras de rua — e, do outro, composições vibrantes e mágicas, onde a cor e o traço convocam o olhar a sair da zona de conforto.
Para o renomado escritor, Marcelo Panguana, que assina o texto de apresentação da obra de Mahumana, estar “fora da caixa” é, sobretudo, um gesto de superação artística e de fidelidade à identidade. “Mahumana é um fotógrafo emprestado às artes plásticas; busca com o pincel cada plano das suas telas, do mesmo modo como a sua máquina fotográfica procura o ângulo perfeito para um clique. (…) As obras presentes nesta exposição satisfazem quem as observa, porque nelas nos reconhecemos, e sentimos que Albino Mahumana, ao pintar todas essas realidades, estava certamente a pensar em nós, povo, como sua principal fonte de inspiração.”
Com um percurso reconhecido nacional e internacionalmente — tendo já arrecadado mais de uma dezena de prémios em países como Portugal, Espanha, Coreia do Sul e Quénia — Albino Mahumana foi também editor de fotografia do jornal Dossiers & Factos, e é um dos fundadores da Associação MatsolArtes.
A complementar o universo de Mahumana, está a pintura intensa e poética de Renaldo Siquisse. A série do artista evoca figuras que vivem num limiar entre a presença e a ausência, entre o visível e o oculto. São corpos altos, por vezes espectrais, que habitam um espaço de urgência emocional e de tensão entre o gesto e o silêncio.
Álvaro Taruma, escritor e crítico, descreve a proposta de Siquisse como “uma cartografia do ser inacabado”, que nos convida a uma pedagogia do olhar. “Cada figura parece dizer: ‘estou à beira’. À beira de romper um silêncio, de cruzar uma linha, de nascer de novo. (…) As figuras estão nuas não apenas no corpo, mas na sua matéria emocional. Cada uma carrega uma flor, como quem oferece um gesto de beleza dentro do caos. E talvez esse seja o coração da obra de Siquisse: o amor como resistência. A fragilidade como força.”
Em “Fora da Caixa”, as obras não se limitam a exibir técnicas e estilos — convocam inquietações. São pinturas que se tornam espelhos e abismos, que provocam a memória colectiva e também a introspecção. Para quem as observa, é impossível sair ileso: cada tela exige presença, escuta e disponibilidade para o desconforto. A exposição torna-se, assim, um exercício de ver e de se ver — com tudo o que isso implica.
A Fundação Fernando Leite Couto, que acolherá esta mostra de 7 a 31 de Maio, volta a afirmar-se como espaço de referência para a arte contemporânea moçambicana, abrindo as suas portas a criadores que ousam arriscar e pensar a estética como território de resistência e liberdade. Com “Fora da Caixa”, Mahumana e Siquisse não apenas expõem: interpelam. Desafiam o público a sair das suas próprias caixas, das suas zonas seguras, e a entrar no terreno fértil da dúvida, da emoção e do espanto.